segunda-feira, 18 de março de 2024

ANTÓNIO AMARGO. QUEM?

 


António Amargo, pseudónimo de António Correia Pinto de Almeida (Figueira da Foz, 1886 – Lisboa, 1933), foi um jornalista, escritor e poeta satírico cuja pena afiada verteu sangue pelas páginas do jornal Gazeta da Figueira, A Capital e Imprensa da Manhã. Colaborador do jornal humorístico Palhinhas, que surgiu em 1915 na Figueira da Foz, escreveu letras para Alfredo Marceneiro, parodiou Os Lusíadas em Republicaníadas (1913) e deu à estampa uns Sonetos Minero-Metálicos (1917) que são hoje referência do futurismo português. No livro António Amargo. Quem? (Xerefé, 201), Ana Biscaia coligiu um pouco de cada uma destas vertentes do autor, ilustradas pelos traços de André Ruivo, Marta Madureira, Rita Carvalho e Sebastião Peixoto. Volume exemplar, quer pelo design impecável, quer pelo trabalho de recuperação de um autor que conserva, a despeito de referências aqui e acolá datadas, uma pertinência atroz:
 
A NOSSA SITUAÇÃO
 
   Estamos positivamente em calmaria podre…
   Ao tranquilo e azulino lago que se chama Portugal, mal chega o rumor da procela que se desencadeou ferozmente na Europa, apenas chegam os rugidos longínquos dessa tempestade funesta, provocada não pelo furor dos elementos, mas pela fúria dos povos e pela insânia dos governantes.
   No nosso risonho país continua-se a respirar o ar puro, embalsamado ainda pelos mil aromas primaveris, que a canícula não secou de todo; e lá ao longe a atmosfera, carregada do cheiro do sangue e impregnada do perfume denso da pólvora, tornou-se quase irrespirável, ameaça asfixiar as ânsias de liberdade, agrilhoada à disciplina militar, que manda ir matar em nome da civilização e à ordem dum ambicioso.
   Nós agora, apertados uns contra os outros neste dourado rincão privilegiado, nem sequer vivemos a nossa própria vida: o nosso corpo continua vegetando aqui, dentro das fronteiras; mas a alma paira além, no teatro da guerra, a imaginação adeja sobre esse tremendo vulcão aberto subitamente no centro da Europa. É lá, nos campos da Bélgica, nas planícies fecundas do mar do Norte ou nas ondas serenas do Mediterrâneo, nas cumeadas dos Vosges ou nas fronteiras da Polónia, nas terras simpáticas da Alsácia ou na pequenez heróica da Sérvia, que nós vivemos a nossa vida espiritual, a nossa verdadeira vida, que é aquela que se vive com o sentimento e com o coração!
   Acima dos terríveis
zepelins e dos ágeis e arrojados aeroplanos, voa também o aeroplano da nossa fantasia, revendo batalhas cruentas, reconhecimentos audaciosos, marchas e contra marchas estratégicas, e ouvindo o rugido tonitruante do canhão que se casa com o estalido dos fuzis e com os estertores dos que caem aqui e ali para não mais se levantar, e que levarão talvez nos lábios uma imprecação contra a civilização que os obriga a morrer, quando lhes sorria ainda tão fagueira a existência!
   Enlevados nesta fantasia vivendo lá mesmo nos campos de operações, e assistindo ao desenrolar das peripécias dessa luta de titãs embrutecidos, deixámos de viver a nossa vida caseira e de compadrio, tão caracteristicamente nossa. Tal, que ontem reendireitava as finanças nacionais, dá hoje às suculentas lições de táctica militar; aquele, que na véspera, se fosse governo, salvava a Pátria, agora, se fosse general, tomava Liége como quem em dias quentes toma um capilé gelado; esse outro, que era capaz de mostrar aos nossos dirigentes o caminho único a seguir, ensina hoje aos
aliados o caminho fácil de Berlim; aquele outro ainda, vence uma poderosa esquadra alemã no mar do Norte com a mesma certeza com que dois dias antes se propunha vencer uma eleição.
   Ninguém pensa em si, ninguém cuida de nós: todos à uma, cá desta sossegada
geral da plateia europeia, só temos ouvidos e olhos para ouvir e ver o que se passa no grande palco sangrento e improvisado.
   Estamos, pois, em calmaria podre…
   Enquanto lá fora rolam as vagas alterosas e vocifera terrível a tormenta, cá dentro, neste remanso bendito, é tanta a clama, que até se suspendeu a vida própria para viver a vida alheia!...
   Triste missão, a do jornal de província, que tem que sair bi-semanalmente… sem ter que dizer!
   Falta-nos a matéria-prima, a má-língua, a discussão, a polémica… estamos desarmados.
   Que os leitores, absorvendo dia a dia o capitoso e violento licor dos
colossos bem informados, nos perdoem esta chavenazinha de chá fraco que lhe enviamos a casa todas as quartas e sábados.
   Servirá ao menos para lhes desgastar o estômago das apimentadas  comidas da guerra…

 
In Gazeta da Figueira, Agosto de 1914.


TEASER

 

Não se preocupem, está tudo bem. É só mais um teaser para o filme "Guerra Civil", de Alex Garland:

«O ex-presidente dos Estados Unidos e candidato Republicano à Casa Branca Donald Trump previu este sábado que haverá um “banho de sangue” no país se perder as eleições presidenciais de novembro contra o atual presidente, o Democrata Joe Biden.

“Se eu não for eleito, vai haver um banho de sangue. Vai ser um banho de sangue para o país”, disse Trump durante um comício no Ohio, o seu primeiro desde que atingiu os números necessários para se tornar o candidato Republicano à Casa Branca, na terça-feira.»

Vem no Expresso.

domingo, 17 de março de 2024

NUNO JÚDICE (1949-2024)

 


OUTRA IMAGEM
 
Conheço o mundo dos mortos. É frio, com terra
por cima, restos de tábuas, ossos desfeitos pelos invernos.
Os mortos vêem-nos: de onde estão, eles chamam pelos nomes
familiares, num murmúrio, e o vento dispersa-lhes os sopros
— música de ciprestes. Por isso, há quem anda entre as campas,
ao fim da tarde, com os ouvidos tapados; quem reze,
entre lábios, datas estéreis como as antigas pedras;
quem persiga a própria sombra, temendo que ela desapareça
sob a erva fresca. Memórias vagas e finais, atormentando-me
num secreto espelho — no canto de mim, absorto
e pálido, quem me diz o nome, em silêncio, sem olhos,
sem lábios, sem os cabelos que outrora toquei?
 
Nuno Júdice, do livro Lira de Líquen (1985), in Obra Poética (1972 – 1985), Quetzal Editores, 1991, p. 294.

PANDEMIA

 
Quitéria recuperou as máscaras cirúrgicas para andar na rua e voltou a cumprir o distanciamento social de 1,5 metros. Diz que anda por aí um novo coronavírus chamado chegavid-24.  

sábado, 16 de março de 2024

PARA LER NA ÍNTEGRA

Há hoje várias indústrias a funcionar no contínuo político-mediático — ou seja, políticos, jornalistas, “jornalismo” politizado, porta-voz de interesses e políticas, jornalistas-comentadores e comentadores —, das quais saliento três com grandes fábricas: a indústria de lugares-comuns, a indústria do tomar à letra, e a indústria das contradições. Depois, tudo é amplificado pelo rebanho ou pela matilha, depende das simpatias do bicho, que pode ser ovelha ou ser lobo. O contexto, a atmosfera, a ecologia é do crescente investimento num jornalismo politizado, que começa de manhã, depois circula o dia todo nas rádios e televisões e, por muito que isso indigne os próprios, é hoje maioritariamente, e muito, de direita. Quando há gente do PS, são os PS fofinhos que estão sempre prontos para querer aquilo que é, no seu entender, “moderação” com a direita.

(...)

A politização do jornalismo nem sempre é resultado da volição política do jornalista; pode ser um efeito do rebanho ou da alcateia, mas é hoje tão comum que ninguém diz “Pára aí” ou “O rei vai nu”. A profunda identidade entre os relatos jornalísticos e a agenda da direita foi evidente quanto à “crise dos serviços públicos”. Significa que houve “crise”? Sem dúvida, mas teve o alcance dramático com que se relatou? Não. Usaram-se muitas vezes casos pontuais para “alimentar”, dia após dia, a ideia da “crise”? Sim. As estatísticas mais sérias e sólidas confirmavam a agudeza da “crise”? Não. Esteve sempre presente a ideia às claras ou subliminar de que a “crise” se devia à “ideologia estatista” contra os privados? Claro que esteve, é aí que os jornalistas politizados saem do seu casulo matinal para disseminar as suas posições políticas como comentadores e que, se fosse num país anglo-saxónico, se identificariam como apoiantes de A ou B, para que o que dizem trouxesse a tão falada transparência. E muitos dados pertinentes, como seja a comparação entre os tempos de espera dos hospitais privados e os públicos, nunca tiveram nenhum papel na “informação”.

Excelente artigo de José Pacheco Pereira, no Público.

DOIS POEMAS DE HART CRANE

 


AS CARTAS DE AMOR DA MINHA AVÓ MATERNA

Esta noite não há estrelas
além das da memória.
Porém, quanto espaço resta para a memória
no espartilho da chuva suave?

Ainda resta espaço suficiente
Para as cartas da mãe de minha mãe,
Elizabeth,
Há tanto comprimidas
Num canto do telhado
Que ficaram castanhas e moles,
Passíveis de derreter como a neve.

Sobre a grandeza de tal lugar
Os passos devem ser gentis.
Tudo está preso por um cabelo branco invisível.
Treme como galhos de bétula tecendo o ar.

E eu pergunto-me:

“São os teus dedos suficientemente compridos
Para tocar velhas teclas que não passam de ecos:
Será o silêncio suficientemente forte
Para devolver a música à sua raiz
E trazê-la de novo para ti
Como se fosse para ela?”

No entanto, levaria minha avó pela mão
Através do muito que ela não entenderia;
Então tropeço. E a chuva continua no telhado
Soando como um riso gentilmente piedoso.

*

HIEROGLÍFICO

Alguém olhou para o que viu
Ou alguém viu o que olhou?

Hart Crane, in "The Complete Poems of Hart Crane - The Centennial Edition", introduction by Harold Bloom, edited by Marc Simon, Liveright, 2000, p. 189. Versões de HMBF.

sexta-feira, 15 de março de 2024

O PROBLEMA

 
Quitéria, a cigana, diz que o problema dos comunistas é terem deixado de ser revolucionários, ao mesmo tempo que o problema dos revolucionários é terem deixado de ser comunistas.

DIZ ANTÓNIO GUERREIRO

(…)

Há mais de um milhão de pobres e excluídos racistas e xenófobos? É muito fácil perceber que, potencialmente (e essa classificação apenas com base no sentido de voto não é legítima nem correcta), há certamente ainda muitos mais. Não por convicção ideológica racionalizada, mas porque habitam no interior de uma cultura que promove a condição de possibilidade do extremismo político.
No interior do Alentejo (para me ater à experiência pessoal), o racismo contra os ciganos só tem paralelo com os guetos dos judeus sob as leis raciais do nazismo. É um racismo sem pudor nem censura social e que exige que eles se integrem ao mesmo tempo que os considera não-integráveis. Esta “fobia” não procura razões históricas e sociais: faz do “eterno” cigano, como outrora o eterno judeu, um indivíduo que, por motivos “raciais” e por enraizamento mítico a uma cultura da segregação, é um pária.
Esta nova pobreza eminentemente cultural tem um enorme poder de difusão. O seu modelo não é compatível com uma consciência de classe. Para haver uma “classe” é preciso que intervenha este factor: a solidariedade. Só através da solidariedade a consciência de classe se torna activa e faz com que aquilo que era pura e simplesmente uma massa, uma multidão gregária, passe a ser uma classe. Ora, o que os indivíduos que fazem parte desta massa têm em comum são os interesses privados. E, no fundo, eles não concebem a cidadania senão segundo o modelo do cidadão-painelista, produtor e consumidor de bens e serviços sociopolíticos.
Não, estes novos pobres, na sua maioria, não têm nada em comum com os antigos “pobrezinhos” nem com uma cultura popular, e só por altura de eleições é que se tornam politicamente representáveis. No resto do tempo são a realização concreta e definitiva da mediocridade, do estilo de vida mais contagioso e exportável.

Público, 15 de Março de 2024.

quinta-feira, 14 de março de 2024

BANDALHEIRA

TikTok em risco nos Estados Unidos, é a notícia. Vamos ter cada vez mais vezes notícias destas, a pressão é imensa, a panela já rebentou e a sujidade espalha-se por todo o lado. Por cá, perguntemo-nos quantas pessoas já foram condenadas pela propagação de discurso de ódio? Quantos elementos do Movimento Zero, devidamente identificados, foram julgados e expulsos das forças policiais por comportamento indevido? Porque pode ser eleito deputado alguém que passa a vida a propagar mentiras e falsidades, em alguns casos até com condenações efectivas por difamação e afins? A democracia não tem sabido defender-se. A bandalheira de que se fala, e para a qual mais contribui quem dela fala, não tem sido devidamente e implacavelmente tratada. Precisamos de uma democracia impermeável ao ódio, à falsidade, não dá para ser meigo nestas matérias. É trágico que tenhamos chegado onde chegámos, não foi por falta de aviso. Foi por total e absoluto desleixo de quem tinha a obrigação de nos defender, de defender a democracia dos seus inimigos. A propagação da mentira não é liberdade de expressão, é crime. A propagação do ódio não é liberdade de expressão, é crime. E é como crime que essas coisas têm de ser tratadas, com as devidas consequências. Se eu não posso fazer negócios com o Estado porque me atraso no pagamento de um cêntimo de imposto, porque pode ser deputado quem tem no currículo condenações por difamação?

quarta-feira, 13 de março de 2024

ACORDAI

 
Pego no telemóvel e a primeira coisa que vejo é um vídeo da Rita Maria a explicar porque o Chega não é fascista. Diz que não é porque o Tribunal Constitucional não deixa, a esquerda é que diz que é porque eles querem acabar com a corrupção. E a corrupção é a esquerda, nomeadamente o Sócrates que ainda anda para aí sem ser julgado. Dezenas de milhares de jovens multiplicados por dezenas de milhares de pessoas vão ver aquilo que eu vi, eu que nem tenho TikTok. O vídeo foi feito e partilhado numa rede especialmente vocacionada para jovens, mas vai seguir por whatsapp, estará nos reels do Facebook, vão encontrá-lo no Instagram e no X. A mensagem vai chegar a milhões de pessoas, sem contraditório e com uma clareza desarmante. Sim, a política já não se faz só nas ruas, a distribuir papéis que praticamente ninguém lê, nem em almoços de domingo. O mundo mudou radicalmente nos últimos 20 anos, a "direita progressista" tem sido muito mais hábil e inteligente na assimilação dessa mudança do que a "esquerda conservadora". A imagem determina, a clareza manda, a aparência seduz. Num país onde 60% da população não lê um livro, estão à espera que leiam os programas chatos dos partidos políticos? Acordai, sim, acordai vós que esperais que o povo acorde. A hipnose é mais profunda do que julgais.

terça-feira, 12 de março de 2024

VEM NO PÚBLICO

"Será que, como disse Pedro Nuno Santos na noite de domingo, não “há 18% de portugueses votantes racistas e xenófobos, mas há muitos portugueses zangados”? Se olharmos para os números, o líder do PS está completamente errado. Há muitos mais portugueses com sentimentos racistas, só que, até ao momento em que o Chega tornou aceitável dizê-lo em voz alta, guardavam esses sentimentos para si e não tinham onde votar.
O respeitável European Social Survey de 2018/2019 era bem claro: 62% dos portugueses questionados perfilham pelo menos a crença no racismo biológico ou no racismo cultural. Só 11% dos inquiridos discordavam de todas as crenças racistas. Depois de 10 de Março, podemos continuar a fazer como o líder socialista e olhar para o lado, quando a realidade não nos agrada, ou, em alternativa, podemos tentar ponderar seriamente as razões que levaram mais de um milhão de portugueses a reforçar a presença da direita radical no Parlamento português."

O resto leiam por lá. Assina David Pontes.

Isto é o país que temos, não vale a pena disfarçar. Toda a Europa colonialista é isto, de um modo mais ou menos exacerbado.

Outro dado interessante é a baixa escolaridade deste eleitorado, composto maioritariamente por homens com o 12⁰ ano. Há décadas, ainda o Chega era uma miragem, que muita gente anda a alertar para o problema, nomeadamente referindo-se à descredibilização do ensino, à política dos números que nivelam sempre por baixo para apresentar resultados por cima. Esta falta de exigência é o vírus, a doença manifestou-se, agora é tempo de a tratar. Vai ser difícil, as metástases são muitas.

A reter, e vocês façam a experiência, é que inúmeras pessoas que se queixam do estado do país não fazem a mínima ideia do que se estão a queixar. Queixam-se na base de percepções incutidas por CMTVs e afins, vídeos virais no YouTube e restantes redes sociais, generalizando fenómenos particulares e isolados. A intoxicação pelo medo traz sempre resultados, sempre. Michael Moore desmontou isso bem no documentário “Bowling for Columbine”.

É óbvio que há muita gente a passar dificuldades, sufocada por uma carga fiscal que não compreende, malta nova sem perspectivas de futuro, gente que ganha para pagar casa, carro, água, luz, gás, e passa a vida a fazer contas. Sim, essas pessoas existem. Não são, apesar de tudo, os verdadeiros miseráveis. Esses têm, na sua maioria, um nome: imigrantes. Dividem quartos com 5, 6, 7 pessoas, vivem na rua, são explorados como mão-de-obra barata nas estufas do Alentejo e do Algarve, nos campos de Santarém e no pão de Rio Maior. Fazem pela vida sujeitando-se a condições que os portugueses que os temem, odeiam ou desprezam jamais se sujeitariam.

O paradigma mudou, é verdade, mas há coisas que jamais mudarão. Os maiores inimigos dos pobres serão sempre os menos pobres, beijam a mão aos ricos, fazem o jogo dos ricos na esperança de uma ascensão social que só os frustra. Vão continuar na merda a odiar os que estão por baixo e a beijar anéis ao Papa e os pés a salgados, berardos, filipes vieiras e afins, nas suas jogatanas e esquemas e negociatas de pequena corrupção de que se gabam entre amigos. Escárias há muitos, nunca deviam chegar aos gabinetes.

MIGUEL GULLANDER (1975-2024)

 


Conheci-o na Nazaré, salvo erro em 2016. Depois trocámos e-mails. Nunca mais o vi. Enviava-me livros de autores africanos, guineenses. Não publicou muito, mas publicou bem. "Através da Chuva" (Dom Quixote, 2014), por exemplo, ou o belíssimo "A Balada do Marinheiro-de-Estrada" (Cavalo de Ferro, 2005). Partiu.

segunda-feira, 11 de março de 2024

A NOITE ELEITORAL SEGUNDO QUITÉRIA

 


1. A abstenção é boa e não sabíamos
2. Gonçalo da Câmara Pereira é, finalmente, um homem livre
3. O PS pode começar a arrumar as estantes com livros
4. Boliqueime mantém o bom gosto
5. A Iniciativa Liberal está de parabéns, conseguiu transformar um trol num tipo que enfim
6. A avó da Mariana já pode descansar em paz, isso é positivo
7. Ainda bem que o PCP é contra a eutanásia, assim como assim fica ligado à máquina
8. Rui Tavares não é gago
9. O PAN ladra mas não morde
10. O trio de ataque está de parabéns

E é tudo. Ficamos por aqui em matéria de legislativas.

LEGISLATIVAS

 
Em 2 anos, o PS perdeu 486 700 votos.
Em 2 anos, o Chega ganhou 723 191 votos.
Em 2 anos, o PAN perdeu 33 322 votos.
Em 2 anos, o Livre ganhou 130 915 votos.
Em 2 anos, a CDU perdeu 34 080 votos.
Em 2 anos, o BE ganhou 33 739 votos.
Em 2 anos, a AD ganhou 146 676 votos.
Em 2 anos, a IL ganhou 43 619 votos.
 
A abstenção acordou e votou Chega. Houve uma deslocação de votos do PS para o Chega. Estas são as únicas duas conclusões óbvias.
 
O crescimento do Chega resulta de um país cada vez mais assimétrico, é de raiva contra a percepção errada, veiculada pelos média, de um país corrupto. E é de adesão à narrativa anti-imigração. O Chega cresce mais onde há mais imigração. Isto revela não só um país, aproxima-nos do resto da Europa. Em Itália, Meloni chegou ao poder. Em Portugal, Ventura também chegará se as forças democráticas não souberem dar resposta ao que andaram a disfarçar durante 50 anos: o país que temos, a gente que somos. Um país conservador, subordinado, católico, uma gente invejosa, racista. Nos Lusíadas já era assim.
 
Uma aposta: a grande discussão na próxima semana será sobre as razões do crescimento do Chega. Uma certeza: ninguém vai dizer a verdade. Somos um país racista, com uma justiça de merda e uma educação deficiente.

PASSIVO

 
Não consigo entender a passividade dos jornalistas diante do sapo, é como se ficassem hipnotizados. Anda com 1 108 797 votos na boca e não há ninguém que lhe atire 5 031 472 às trombas? Porque é que estes hão-de ficar reféns dos outros?

domingo, 10 de março de 2024

BLA, BLA, BLA

 
Eu, que não tenho nada que ver com aquele esterco, entro no Facebook e mamo com aquilo, abro o X e mamo com aquilo, passo pelo YouTube e lá está aquilo, ligo as televisões e é só aquilo, olho para as capas dos jornais e é aquilo... O fenómeno viral tomou conta das nossas vidas, instalou-se na AR e vai votar leis com implicações na vida de todos. Aquilo é uma miscelânea de oportunistas, xenófobos, racistas, salazaristas, negacionistas, saudosistas, protofascistas, levados ao colo por meios de comunicação famintos de soundbites que alimentem audiências, rendidos às regras da sociedade do espectáculo, eleitos por gente desesperada e enraivecida. Ainda andam a discutir o que é aquilo? Estão admirados? A sério? Com uma justiça inoperante a dar de comer àquilo? Com sucessivos casos de corrupção a alimentarem aquilo? Com Presidentes da República boçais e ministros indiferentes aos protestos dos profissionais que tutelam? Deixem de ser sonsos. Todos a contribuírem para que aquilo esteja incessantemente na sombra, como uma cantiga medíocre que, de tantas vezes ouvida, até que entra no ouvido e, depois, sem que percebamos como damos por nós a trauteá-la. Habituem-se, dizia o outro. Já estamos a habituar-nos. O orçamento mais à esquerda de sempre valeu.

 

sábado, 9 de março de 2024

QUEM TE AVISA

 
André Ventura, Santiago Abascal, Marine Le Pen, Giorgia Meloni, Viktor Orbán, Donald Trump, Jair Bolsonaro, Javier Milei, Geer Wilders, Vladimir Putin, Benjamin Netanyahu… Cuidado com os planos do Xi Jinping para dominar o mundo, avisa a Quitéria.

sexta-feira, 8 de março de 2024

TELEVISÕES

 


Marques Mendes, Paulo Portas, Helena Matos, Miguel Relvas, Sebastião Bugalho, Rui Calafate, António Lobo Xavier, Francisco Mendes da Silva, José Eduardo Martins, Miguel Poiares Maduro, Maria João Avilez, Pedro Marques Lopes, João Miguel Tavares, Miguel Morgado, José Miguel Júdice, Cecília Meireles, Maria João Marques, Helena Ferro Gouveia, etc, etc, etc... Se isto é jornalismo, eu sou um génio da lâmpada.

BOLINHA VERMELHA

 
Quitéria é da opinião que a SIC Notícias devia ter uma bolinha vermelha a dizer "Tempo de Antena da AD". Cipriano concorda.

quinta-feira, 7 de março de 2024

EM ALTERNATIVA

 
Inspirada pelo slogan do Volt, "Paixão pelo bom senso", Quitéria vem propor algumas alternativas que deixa ao cuidado dos interessados:

- Doidos pela normalidade
- Malucos pela lucidez
- Loucos pelo razoável
- Dementes pela saúde
- Insanos pelo juízo
- Mentecaptos pela moderação
- Desequilibrados pelo equilíbrio
- Alienados pelo módico
- Enlouquecidos pelo tolerável
- Birutas por atilados
- Lelés pela justiça
- Tantãs pelo plausível
- Tresloucados pelo siso
- Lunáticos pelo sadio
- Pancada pelo judicioso
- Esclerosados pelo suportável
- Varridos da cuca pelo sensato
- Destrambelhados pela ordem
- Sandeus da rectidão
- Vesanos da verticalidade
- Zuretas do plausível
- Estroinas da brandura
- Maníacos da bonança
- Valdevinos da mansuetude
(...)

quarta-feira, 6 de março de 2024

FÁBULA DO SAPO E DO ESCORPIÃO

 


"A vida das pessoas não está melhor, mas a vida do país está muito melhor."
Luís Montenegro, líder parlamentar do PSD
JN, 20-02-2014
 
Lê-se por aí que Rui Gomes da Silva é a única força viva que não sei quê. Força viva. Rui Gomes da Silva. O pior é que há gente bem viva alinhada com o pensamento deste zombie. Montenegro bem pode disfarçar, os sinais de fumo não enganam. Ele é a imigração e a insegurança, as falsas razões climáticas, a reversão da lei da interrupção voluntária da gravidez, entre outros mimos de que Câmara Pereira é o rosto das cavernas mantido à distância e o rosto de Nuno Melo é a víbora a espreitar do ninho. Esta gente que se sente insegura com os imigrantes passou a vida a lamber as botas a Ricardos Salgados, Joes Berardos, Luízes Filipes Vieiras e afins. Ainda me lembro de José de Oliveira Costa num governo do Cavaco. Esta gente é que me inspira insegurança, estes e os Sócrates e os Duartes Limas e os Armandos Varas e mais toda essa escumalha que encontrou abrigo no Chega do mini-Trump. Portugal não precisa desta gente, deste cheiro a mofo e a naftalina, deste desfile de zombies a quererem impor modos de vida, deste bando que enche as igrejas aos domingos para pecar sem peso na consciência o resto da semana. O PPD-PSD foi a incubadora de Ventura, está cheio de Malós de Abreu, Ruis Gomes da Silva, Santanas e Coelhos e defensores do tiro ao pombo. Se pensam que aquilo pode ser diferente do que é, lembrem-se da fábula do sapo e do escorpião na hora de votar:
 
Um escorpião pede a um sapo que o leve através de um rio. O sapo tem medo de ser picado durante a viagem, mas o escorpião argumenta que se picar o sapo, o sapo iria afundar e o escorpião iria se afogar. O sapo concorda e começa a carregar o escorpião, mas, no meio do caminho, o escorpião acaba por ferroar o sapo, condenando ambos à morte. Quando perguntado pelo sapo por que havia lhe picado, o escorpião responde que esta é a sua natureza e que nada poderia ser feito para mudar o destino.

terça-feira, 5 de março de 2024

UM ESPANTA-ESPÍRITOS DE JOÃO PEDRO MÉSSEDER

 


Confrangem no poema
a eterna doença do eu
e a lamentação.

18-8-2019

João Pedro Mésseder, in "Espanta-Espíritos", Editora Licorne, 2020,  p. 38.

AVANTE

 
Paulo Raimundo foi ontem ao programa do Ricardo Araújo Pereira e fez uma bela publicidade à Festa do Avante. Quitéria aguarda em pulgas os comentários críticos de José Milhazes.

segunda-feira, 4 de março de 2024

SEMEAR


 

Hoje foi manhã de luta, a semear em Março para colher Abril. A tarde e a noite também serão de luta, sempre a cuidar de Abril. Pela liberdade, pela solidariedade, por um país onde não existam portugueses de primeira e portugueses de segunda, por uma distribuição mais justa da riqueza, pela cultura, pelo direito universal à educação, pelo direito universal à saúde, pelo direito universal à habitação, pela paz, por um país com massa crítica, capaz de dizer não ao racismo, à xenofobia, ao machismo, à homofobia, um país humanista, um país capaz de dizer não ao populismo acéfalo das notícias falsas, da manipulação, da propagação de mentiras e aldrabices, um país capaz de dizer não ao fascismo. Pela democracia, contra a política do "pão e circo", contra os engodos em rede que intoxicam e dividem para reinar. Pela emancipação dos indivíduos, pela liberdade.